Notícias


Entidades presentes ao evento Violência de estado, direitos humanos e a questão indígena lançam carta manifesto contra a violência do Estado e pela defesa intransigente dos direitos sociais das popula


Publicado em: 15 de abril de 2015
Créditos: CRP SP
Fotos: CRP SP

Carta manifesto contra a violência do Estado e pela defesa intransigente dos direitos sociais das populações indígenas brasileiras. Atualmente, fazem parte da população brasileira cerca de 900.000 indígenas pertencentes a 305 povos originários (IBGE, 2010). Estas populações estão distribuídas por todo o território nacional, estando presentes desde os grandes centros urbanos até regiões mais afastadas e de baixa densidade populacional. Nos últimos trinta anos, os povos indígenas brasileiros intensificaram sua participação organizada na vida política institucional do país, conquistando o reconhecimento de muitos direitos. Marco central desse processo, a Constituição de 1988 garante a essas populações a ocupação de seu território tradicional assim como sua organização social, seus costumes e tradições. Infelizmente, nos últimos anos temos assistido a um intenso retrocesso dessas garantias. A postura intransigente ou omissa do Estado brasileiro em diferentes frentes de luta para efetivação dos direitos garantidos às populações indígenas tem proporcionado o acirramento de conflitos e ameaçado as condições de sobrevivência dessas populações. Tal postura tem intensificado a violência contra os povos indígenas pelo assassinato de lideranças e pela difusão de discursos preconceituosos que propagam o ódio, além de outras estratégias para enfraquecer suas formas de organização. Nós, entidades presentes ao evento Violência de estado, direitos humanos e a questão indígena: lutas e resistências ontem e hoje, realizado no dia 12 de setembro de 2014 na sede do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP), somamos forças por meio desta carta para afirmar nossa indignação e exigir ações concretas no sentido de reverter as diferentes expressões da violência contra as populações indígenas. Por entender a relevância e a continuidade histórica de algumas dessas expressões, destacamos e exigimos: Violência de Estado - A efetivação da Convenção 169 da OIT que garante a consulta livre, prévia e informada sobre todas as ações do Estado que envolvam, em alguma instância, os povos indígenas. - Que seja declarada a inconstitucionalidade da Proposta de Emenda Constitucional 215, a PEC 215. Caso ela seja aprovada, a competência da demarcação das terras indígenas será transferida da União para o Congresso Nacional, o que dificultaria ao extremo a realização das demarcações previstas. A proposta também possibilita a revisão das terras já demarcadas. Outra mudança seria nos critérios e procedimentos para a demarcação dessas áreas, que passariam a ser regulamentados por lei, e não por decreto, como é atualmente. - Que seja instalada uma Comissão da Verdade indígena em 2015, dando continuidade à Comissão Nacional da Verdade iniciada em 2012. É imprescindível que se reconheçam as violações de direitos contra os povos indígenas durante os vinte anos de ditadura militar. Em consequência das transferências forçadas, pacificações apressadas, chacinas, epidemias, torturas e assassinatos, aproximadamente 10 mil indígenas morreram e centenas de aldeias foram destruídas. Além desse reconhecimento, exige-se do Estado brasileiro a reparação coletiva a essas populações pelos danos psicossociais causados por tanta violência. Educação - No que tange à Educação não-indígena, que sejam efetivadas as políticas publicas voltadas para o ensino da história e cultura indígena, pela da implementação da lei 11.645/08 em todo Brasil. O Estado brasileiro e a Educação têm uma divida histórica para com os povos indígenas, e a efetivação lei 11.645/08 é uma medida determinante para a reversão desse quadro. - Que o protagonismo indígena seja fortalecido pelo acesso ao ensino superior, garantindo políticas educacionais voltadas para o ingresso e a permanência de indígenas na universidade. - Que se valorizem a cultura indígena e seus protagonistas na educação indígena, desconstruindo o modelo integracionista do Estado brasileiro, que é a continuidade da matriz colonial na educação. Defendemos que os indígenas e suas próprias organizações participem diretamente na formulação de políticas públicas para a educação de seus povos. Saúde - Que se reconheça que grande parte das vulnerabilidades psicossociais que afetam a saúde física e mental dos indígenas é consequência das formas de marginalização e conflito que envolvem a luta pela terra, a invisibilização dos povos originários, do preconceito e do questionamento da identidade indígena no mundo contemporâneo. - Que se identifique a persistência de ações do Estado brasileiro e da sociedade envolvente que continuam a dificultar a possibilidade de que os indígenas detenham nos seus territórios, costumes e práticas sustentáveis, bem como obstaculizam o pleno exercício da capacidade dos povos para gerirem os processos promoção da saúde. Essas ações envolvem tentativas de mudança na Constituição Brasileira, criando uma situação de contínua instabilidade perturbadora da paz nas comunidades. - Que sejam respeitadas as leis brasileiras que dispõem sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes, que preconizam que o diálogo com as populações indígenas deve pautar adaptações menores ou maiores no funcionamento dos serviços de saúde, de modo a respeitar as especificidades socioculturais da população atendida. Em especial, a lei número 9.836, de 23 de setembro de 1999, que obriga o sistema de saúde "a levar em consideração a realidade local e as especificidades da cultura dos povos indígenas e o modelo a ser adotado para a atenção à saúde indígena, que se deve pautar por uma abordagem diferenciada e global, contemplando os aspectos de assistência à saúde, saneamento básico, nutrição, habitação, meio ambiente, demarcação de terras, educação sanitária e integração institucional"; que devem "ocorrer adaptações na estrutura e organização do SUS nas regiões onde residem as populações indígenas, para propiciar essa integração e o atendimento necessário em todos os níveis, sem discriminações"; e que "as populações indígenas terão direito a participar dos organismos colegiados de formulação, acompanhamento e avaliação das políticas de saúde, tais como o Conselho Nacional de Saúde e os Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde, quando for o caso". Em vista do apresentado, nos manifestamos contrários a qualquer iniciativa de implementação de políticas públicas de saúde que não sejam amplamente discutidas e consensuadas entre os diversos povos indígenas que habitam o território brasileiro. Portanto, o Conselho Regional de Psicologia e as entidades que subscrevem este documento, na defesa da garantia de direitos dos povos indígenas, se posicionam a favor de práticas democráticas que busquem a efetivação de ações que imprimam continuidade de debates e diálogos já promovidos, exigindo do Estado o seu compromisso em salvaguardar os direitos da participação dos legítimos interessados nas decisões que os afetem diretamente e, como princípio, valorizar os aspectos culturais, fortalecendo a identidade étnica desses povos. Por esse documento nos manifestamos contra a violência do Estado e exigimos ações concretas que garantam os direitos sociais dos povos indígenas do Brasil.