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Nota de repúdio ao PLS nº 513/2011, que regulamenta a privatização do sistema carcerário


Publicado em: 23 de outubro de 2015
Créditos: CRP SP
Fotos: CRP SP

As organizações que abaixo assinam vêm apresentar nota de repúdio ao PLS nº 513, de 2011, que estabelece normas gerais para a contratação de parceria público-privada para a construção e administração de estabelecimentos penais, ou seja, a privatização do sistema prisional brasileiro.   Atualmente, o número de pessoas presas no Brasil supera a população de oito capitais brasileiras, ultrapassando a faixa de 600.000 pessoas. No período de vigência da atual Constituição, o crescimento da população prisional foi de 595%, o maior do mundo. Este processo de encarceramento em massa, cujo alvo é a população jovem e negra das periferias, foi acompanhado de uma significativa piora nas condições de aprisionamento.   De fato, o sistema penitenciário brasileiro é caracterizado pela insalubridade, superlotação e violação dos direitos humanos mais básicos. O déficit de vagas supera 230.000 vagas, a despeito de ser o país que mais constrói presídios no mundo, em uma política insistente e comprovadamente equivocada.     A privatização dos presídios, objetivo do projeto ora repudiado, em vez de representar uma solução para o problema apresentado, significa a forma mais intensa para o seu agravamento. Não é preciso muito esforço para perceber que a partir do momento em que a prisão passa a ser fonte de lucro, o investimento neste setor requer um número cada vez maior de prisões e o aumento do tempo do cumprimento de penas. Sem maiores disfarces, o artigo 9° do PLS determina que “o concessionário será remunerado com base na disponibilidade de vagas do estabelecimento penal”.   Assim, o PLS nº 513/2011 significa um projeto impulsionador do processo de encarceramento em massa no Brasil. Evidentemente, não é só o aumento do número de presos que representa maior lucro, mas também a redução de gastos com o aprisionamento, o que culmina nas tristes assertivas: quanto mais presos, maior o lucro; quanto menos direitos, maior o lucro. O projeto de lei repudiado não é apenas inadequado, pois fatalmente fortalecerá o encarceramento em massa com piora nas condições de aprisionamento, como é gritantemente inconstitucional em sua integralidade.   A título de exemplo, destacamos três aspectos fundamentais:   1 – delegação da função punitiva do Estado para particulares: o monopólio estatal do poder de punir é violado pelo parágrafo único do art. 5° do PLS, que prevê, expressamente, que “o quadro de pessoal dos estabelecimentos prisionais será formado e contratado pelo concessionário”, sendo que apenas os cargos de diretor e vice-diretor serão ocupados por servidores públicos de carreira. Na prática, isso representa a transferência do poder punitivo e disciplinar para uma empresa privada, que passará a gerir todos os aspectos da execução da pena, como, por exemplo, a atribuição de uma falta disciplinar, que implica um grande endurecimento da pena e impede o exercício de direitos, como a progressão de regime. Se a fonte de lucro do empresário é o maior tempo de aprisionamento do maior número de pessoas, seus funcionários fatalmente exercerão o poder disciplinar com uma lucrativa intensidade;   2 – privatização da assistência jurídica: o inciso I do artigo 6° do PLS prevê que a concessionária manterá para os presos o serviço de assistência jurídica, o que afronta diretamente o art. 134 da Constituição, que traz a Defensoria Pública como único órgão responsável por garantir a defesa dos necessitados em todos os graus, dentre eles, as pessoas presas. A Defensoria Pública é instituição dotada de autonomia pela Constituição, motivo pelo qual deve litigar contra quem quer que seja, inclusive o Estado, quando a situação assim se mostrar necessária. Prova disso são as inúmeras ações em favor da população prisional ajuizadas pela Defensoria Pública de São Paulo desde a sua fundação. O mesmo não se pode dizer de um advogado contratado pela concessionária quando tiver que demandar em favor de uma pessoa presa contra o seu próprio contratante;   3 – superexploração do trabalho do preso: para além da lucratividade advinda do aprisionamento em si, o projeto também utiliza o trabalho do preso como fonte de lucro para as empresas, instituindo um trabalho forçado, que é proibido pela Constituição, além de afastar os direitos trabalhistas garantidos a todo trabalhador. O projeto permite, ainda, a inconcebível transferência do preso que não consentir no trabalho para o concessionário.   Por todo o exposto, as subscritoras vêm manifestar seu repúdio ao inadequado e inconstitucional PLS nº 513, de 2011, que atende aos exclusivos interesses de grupos econômicos e políticos que pretendem lucrar com o aprisionamento massivo da população mais pobre.   São Paulo, 14 de outubro de 2015.   Ação Educativa ACAT – Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura AJD – Juízes para a Democracia AMPARAR – Associação de Amigos e Familiares de Presos/as Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e dx Adolescente – ANCED Associação Redes de Desenvolvimento da Maré CAMI – Centro de Apoio e Pastoral do Migrante Centro de Direitos Humanos de Sapopemba – CDHS Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos Centro Santo Dias de Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo Coletivo DAR – Desentorpecendo a Razão Coletivo Perifatividade Conectas Diretos Humanos Conselho Regional de Psicologia de São Paulo Fórum Nacional de Reforma Urbana Grupo Tortura Nunca Mais IDDD – Instituto de Defesa do Direito de Defesa Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) Instituto de Defensores dos Direitos Humanos – DDH Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC) Justiça Global Luta Popular Mães de Maio Margens Clínicas Movimento Nacional da População de Rua – SP Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania de Marília Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo Observatório da Juventude – Zona Norte Ouvidoria da Defensoria Pública do estado de São Paulo Pastoral Carcerária Nacional – CNBB Pastoral da Juventude do Meio Popular – PJMP Pastoral da Juventude Estudantil – PJE Pastoral da Juventude Nacional Pastoral Fé e Política da Arquidiocese de São Paulo Pastoral Operária Nacional Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais RENILA Revista Crítica do Direito Sefras – Serviço Franciscano de Solidariedade Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo (SASP) Cáritas Brasileira Conselho Pastoral dos Pescadores Pastoral da Saúde Nacional – CNBB   Fonte: Carceraria.org