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17 anos da Lei Maria da Penha: o que psicólogas/os têm a ver com isso?


Publicado em: 7 de agosto de 2023
Fonte: CRP SP
Créditos: CRP SP
Fotos: CRP SP

Nas diversas áreas de atuação da Psicologia, ocorrem atendimentos a  pessoas que estão sofrendo violência doméstica. Mas quantas delas afirmam diretamente que estão sendo vítimas? Quantas mulheres (cisgêneros, transgêneros, travestis etc.) relatam que sofrem agressões físicas ou sexuais? Quantas, inclusive, percebem estar em um contexto de violência, se essa não for assim tão explícita?

 

Como psicólogas/os, conseguimos enxergar indícios quando eles se apresentam em gestos e entrelinhas? Sabemos identificar diferentes tipos de violência? O pai que empurra, o familiar que aniquila aos poucos a autoestima, o/a namorado/a que controla a senha do celular, o/a ex que esconde documentos pessoais ou instrumentos necessários ao trabalho, o/a parceiro/a que exige relações sexuais ou utiliza chantagens emocionais para atos para os quais a mulher não se sinta confortável, entre outros.

 

O que fazer diante da violência enquanto psicólogas/os? Pensar em diagnósticos individuais? Trabalhar as relações em clínica, mas fora do contexto no qual que estão inseridas? Exigir que a mulher denuncie? Quebrar o sigilo para que todos saibam? Ou ainda: tentar não se envolver, não perceber?

 

Saiba que a Psicologia está envolvida. Desde os princípios fundamentais do nosso Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o até normativas como a Resolução CFP 08/2020 – que orienta a atuação de psicólogas/os em relação às violências de gênero. Posicionamo-nos firmemente em defesa dos Direitos Humanos e baseamos nosso trabalho “no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade, da integridade, da saúde e da qualidade de vida das pessoas”, contribuindo para a “eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

 

É preciso, por vezes, perceber a violência não verbalizada que se esconde por trás de outras demandas, outras queixas, permeadas pela insegurança, pelo medo, pelo baixo autoconceito, pela falta de perspectivas.

 

Na prática, isso se faz ouvindo e amparando mulheres com informações sobre seus direitos, orientando e encaminhando para os serviços existentes, com respeito pelo tempo de cada uma no processo de identificação da violência vivida, distanciamento do agressor e formalização de denúncia. O Artigo 10º do Código de Ética profissional da/o Psicóloga/o  prevê a quebra do sigilo profissional em situações de violações de direitos e pode ser utilizado, por exemplo, para fundamentar a decisão de psicólogas/os que decidem reportar violências a  outros órgãos competentes. É dever profissional agir em situações de risco, prezando pelo menor prejuízo.

 

No entanto, também é nosso dever compreender cada situação em seu caráter único e complexo. No caso da violência doméstica, isso inclui entender os riscos envolvidos na própria denúncia e na configuração socioeconômica, familiar e cultural de cada pessoa atendida. Para embasar nosso exercício profissional, devemos buscar ativamente conhecimento sobre o tema e sua relação com a rede de proteção existente em cada região, caso esses encaminhamentos sejam necessários.

 

Precisamos lembrar que o fenômeno da violência doméstica é complexo, sendo que o/a agente agressor/a é, ao mesmo tempo, a pessoa amada por essa mulher, o que torna extremamente doloroso identificar que ambas as figuras fundem-se na mesma pessoa. Às vezes é preciso elaborar, fortalecer-se psiquicamente, para então romper com o círculo da violência. Para isso, o nosso auxílio é fundamental. Não podemos, como o restante da sociedade, deduzir que a mulher não deseja mudar sua história apenas porque não consegue, prontamente, denunciar.

 

Desde 7 de agosto de 2006, a Lei Maria da Penha mobiliza conquistas no âmbito judicial e também na promoção social dos direitos das mulheres. Seu legado é observado na criação de políticas públicas, como o Disque Denúncia 180 e uma rede cada vez maior de acolhimento especializado  e enfrentamento da violência. Mas hoje, após 17 anos, ainda enfrentamos desafios em sua implementação. Segundo o Fórum de Segurança Pública (2023), o primeiro semestre do ano passado registrou aumento de 3,2% nos feminicídios, o que sobe para 10,8% quando comparada a 2019. Para além da Lei, são necessários mobilização e orçamento público. Criar Delegacias da Mulher que funcionem 24 horas e que possuam equipes de fato qualificadas, criar Conselhos da Mulher e anexos judiciais de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher em todas as comarcas, criar programas de prevenção e medidas para a integração efetiva dos equipamentos da rede, além de combater, socialmente, as estruturas de opressão de gênero, sexualidade, raça/etnia e classe.

 

A Psicologia precisa ser parte dessa luta, defendendo ativamente o direito de todas as pessoas a viver sem violência.

 

#ParaTodosVerem Card quadrado, com foto de mulheres em manifestação segurando uma faixa escrita basta de feminicídio. (fim da descrição).


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direitos humanos