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30 de Novembro - Dia do Estatuto da Terra - Colonização, Lei de Terras, Estatuto da Terra e Especulação Imobiliária


Publicado em: 29 de novembro de 2023

Cadê a Demarcação e Reforma Agrária?

Em uma sociedade fadada ao asfalto e à especulação imobiliária, nos distanciamos sistematicamente do olhar para uma parte de extrema importância na história do Brasil, que é a luta por terra - e território. 

Vale lembrar que a partir dos anos de 1500, um imenso território foi invadido por diferentes nações europeias. O chamado “Tratado de Tordesilhas” e o “Pacto Colonial” foram estratégias com finalidades de conquista, expropriação e roubo do continente que hoje é nomeado de América, porém, seus povos mais antigos o referenciam como Abya Yala, Pindorama, Pindoretá e tantos outros nomes. Constituiu-se como um projeto de colonização direcionado à exploração da terra e daquilo que vem dela: sua pluralidade de povos e culturas, sua diversidade vegetal, suas medicinas naturais, suas águas, minérios, animais e de tantas outras formas de vida e existências. Para que tal dominação se efetivasse, a escravização e o tráfico de pessoas africanas foi o grande investimento dos Estados europeus.

Em meados de 1850, sob pressão de outras nações europeias e expansão do capitalismo industrial, e também com o objetivo de conter os movimentos de resistência dos povos indígenas, pretos e campesinos, a Coroa Portuguesa adapta seu projeto de exploração. Com o fim do tráfico negreiro e do modelo escravagista, visa “civilizar” e “domesticar” as sociedades colonizadas com a entrada de imigrantes europeus e produção de pessoas consumidoras para o mercado europeu. Junto a isso, institui a chamada Lei de Terras (Decreto nº 601/1850), que entre seus impactos, permitia e regulamentava a invasão e posse dos territórios originários, quilombos e dos pequenos produtores, para posseiros e grandes fazendeiros; garantia anistia e privilégios aos latifundiários; concedia preferências de exportação para o mercado internacional e impedia o direito à terras por famílias libertas - a marginalização, o etnocídio e o domínio da terra enquanto mercadoria, são reafirmados pelas políticas liberais e teses eugenistas de embranquecimento da “população brasileira”.

Relembramos tal percurso para que hoje, 30 de novembro, possamos ter mais consciência para compreender os interesses do Estatuto da Terra (Lei Federal nº 4.504) - promulgado nesta mesma data, no ano de 1964, primeiro ano do Golpe da Ditadura Militar. Com a crescente mobilização dos movimentos campesinos e sindicais, dos quilombos e aldeias no enfrentamento dos grandes posseiros e fazendeiros, o Estado Brasileiro se furta da proposta do controle estatal na expropriação dos grandes latifúndios para distribuição de lotes às famílias camponesas sob a ordem de produção agrícola, estimulando esses pequenos agricultores para produção de subsistência e abastecimento do mercado interno.

No entanto, a herança fundiária do Brasil permanece demarcando o lugar de subalternidade dos povos da terra e o contínuo apagamento de seus conhecimentos e culturas tradicionais na produção de alimento, na conquista do direito à terra e na preservação e proteção de seus territórios. Apesar do Estatuto da Terra prever a Reforma Agrária e o enfrentamento da fome no Brasil, o resultado de aplicação da lei foi um modelo de desenvolvimento agrícola que acabou por privilegiar a monocultura, o uso de agrotóxicos, a intensa e forçada mecanização da agricultura, a perda de sementes crioulas e formas tradicionais de cultivo, a formação dos grandes commodities, aumento gradativo da desnutrição e acirramento das disputas territoriais.

Hoje, os níveis de insegurança alimentar são maiores entre as populações negras, periféricas, indígenas e campesinas (II VIGISAN, 2022), como consequência de uma história que se veste da democracia racial e de políticas de Estado que investem no agronegócio e na bancada ruralista - grandes responsáveis pelos latifúndios, especulação imobiliária e racismo ambiental, - em detrimento da histórica luta de resistência dos povos. 

Afirmamos a necessidade da Reforma Agrária Popular e da Regularização Fundiária Urbana, da Demarcação das Terras Indígenas e preservação ambiental, da proteção aos Territórios Quilombolas e de Comunidades Tradicionais, do apoio ao Movimento Sem-Terra (MST) e Sem-Teto (MTST) na produção de alimento agroecológico no combate à fome.

Só é possível compreendermos a historicidade da disputa de terras no Brasil, se tomarmos a colonização como esse grande marco na constituição da sociedade brasileira. Urge a necessidade de lidarmos com a saúde contextualizada com a história desse território e reconstruirmos a Psicologia como uma ciência e profissão, também comprometida com a garantia de direitos das populações diretamente afetadas pela concentração e invasão fundiária e séculos de escravização no Brasil. Sejamos aliadas e aliados na união das lutas do campo e das cidades, em defesa dos povos e dos territórios de resistência!

Em memória à luta e à vida de Mãe Bernadete e seu filho, Binho do Quilombo, lideranças quilombolas assassinadas pela disputa fundiária. Assim como, de Marcus Vinícius de Oliveira Silva, psicólogo que dedicou sua vida e profissão à proteção dos territórios em resistência.

A reparação histórica e a descolonização também são papéis da Psicologia!
Não ao Marco Temporal!

“Ir contra aquilo que nos é imposto é revolucionário, pois a subserviência, a mansidão diante das ameaças aos nossos direitos e a nossa vida, o conformismo e a assimilação cultural são amarras coloniais que sempre nos quiseram impor ao longo dos séculos.”
“Por Terra e Território: Caminhos da Revolução dos Povos do Brasil”
Mestre Joelson Ferreira, Assentamento Terra Vista/BA

Compartilhamos produções e referências técnicas para atuação das psicólogas e psicólogos dentro da temática, elaborados pelo Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP) e por outras instâncias do Sistema Conselhos de Psicologia (CFP e CRPs):

 Atuação de psicólogas e psicólogos em questões relativas à terra.
 Psicologia e Moradia: Múltiplos Olhares sobre a Questão Habitacional
 Atuação de psicólogas e psicólogos: Relações Raciais
Atuação de psicólogas e psicólogos junto aos Povos Indígenas
 
Atuação de psicólogas e psicólogos com Povos Tradicionais
 
Atuação de psicólogas e psicólogos com População Quilombola (será divulgado em breve!)

Créditos da fotografia: Breno Thomé Ortega.

 

#ParaTodosVerem
Card quadrado, com foto de um homem e uma criança negros em uma plantação. O homem usa camisa do Brasil e segura uma cesta com várias verduras, o menino está ao seu lado e segura as verduras nas mãos e os dois olham para a câmera. Na margem inferior, grafismos em verde escuro e vinho e a ilustração de uma calendário de mesa. (fim da descriçaõ)